Decisões de impacto

MultitaskingTenho dito a vários amigos (as) que me recomendam, entusiasmadíssimos, assistir a este ou àquele seriado de TV: “eu acredito em você, cara, mas a decisão de começar a ver um seriado tem um impacto absurdo na vida de uma pessoa hoje em dia, não é simples assim”. Ainda mais na minha, que sou razoavelmente tardio nesse universo – a primeira vez que fiz uma imersão num seriado foi no fim de 2006, quando ganhei a primeira temporada do “Lost” de presente de Natal e não consegui mais parar de ver. Agora, imagina um cara “defasado” que nem eu, que nunca viu um episódio de “Friends”, “CSI” ou “House”? Sei, meus amigos, que devem ser muito bacanas essas séries. Tenho certeza que tenho excelentes referências que levo em conta na hora de ler um livro, de ouvir uma banda e de ver uma série de TV. Mas se eu me arriscar a ver o piloto do “Friends” hoje, acham que do jeito que eu tenho TOC (não ia conseguir parar de ver até chegar ao último episodio da ultima temporada), o que seria do meu valioso tempo livre? Não sei brincar, esse é o ponto.

Na verdade, acho que à medida que os anos e décadas passam, a gente pouco ou nada muda em relação a quase tudo que nos cerca e às nossas preferências. As atitudes e manias são as mesmas. O que muda são os objetos (evoluem) e as pessoas. Em alguns casos nem isso. Por exemplo, quando eu era moleque, só podia jogar Atari a cada X horas de estudo. Claro que isso tudo era muito teórico e se hoje em dia eu tenho um respeitável currículo nerd e pouco destaque acadêmico, isso deve ter tido uma razão de ser. Mas tem acontecido o mesmo em tempos modernos. Hoje eu só consigo ler um livro depois que terminar uma temporada de um seriado. Ou só me dou ao direito de sair pra tal lugar depois de cumprir uma hora de estudo de guitarra (bem, essa aí tá cada vez mais virando poeira ao vento).

Meu videogame (um Playstation 3) mesmo vive de momentos de pico e outros de completo abandono, porque, se começo a jogar um troço tipo “Red Dead Redemption” ou “God Of War” ou “GTA”, minha sanidade mental começa a se corroer. Ainda que eu ache que, sim, esses jogos (com roteiros e enredos bastante ricos e cheios de detalhes) e seriados hoje em dia acrescentam muito ao nível cultural de um cidadão.

Conheço vários amigos, dos mais letrados aos mais descolados, que têm uma relação meio “Frodo – Anel” com a ideia de comprarem um videogame. Eu percebo que nenhum deles despreza, no seu íntimo, um Playstation 3 ou um XBOX, por mais “discursinho cult” que façam. Acho que eles têm é medo de  “não saberem brincar”. Dá pra ver que nos momentos em que tiveram contato com um equipamento desse porte, sempre rolou algum fascínio em algum grau, fosse por um “Pro Evolution Soccer” ou um “FIFA” ou por um “Batman Asilo Arkham”. Só que, novamente, a simples menção de botar pra dentro de casa esse “elemento estranho” parece demandar uma D.R. incomensurável com a namorada, mulher, esposa e, principalmente, consigo mesmo. É um desafio para o mais concentrado dos sujeitos ter disciplina com essas centrais de entretenimento que se instalam em nossas casas sem a gente perceber. Pode consumir não duas ou três, mas oito, dez, doze horas seguidas no dia de um cidadão desprevenido. Decisão muito delicada e importante em nossas vidas que muita gente só percebe depois que joga o monstrinho na sala.

Eu, mesmo não tendo de consultar ninguém sobre este ou aquele hábito ou maratona de seriado (ou de livro, como “As Crônicas de Gelo e Fogo”, verdadeiras biblias que levam meses para serem lidos), já me vejo numa (boa, convenhamos) encruzilhada diária. E você?